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O longevo período de governo do imperador Justiniano (527-565) recebe grande destaque da historiografia dedicada ao Império Bizantino no período tardo-antigo, entre outras coisas, pelas chamadas “Guerras de Reconquista” ou de “Restauração”. Foram conflitos militares nos quais as tropas bizantinas enfrentaram os persas, nas fronteiras orientais, vândalos, no norte da África, e godos, na península itálica. Essa titulação ficou conhecida na historiografia dedicada ao tema por ter tido como resultado a ampliação das fronteiras imperiais a territórios que haviam sido perdidos para populações ditas bárbaras, no ocidente mediterrânico, e que haviam sido reconquistadas ou restauradas após vitórias sobre vândalos e godos no Ocidente.
Junto às tropas imperiais, comandadas pelo general Belisário, Justiniano enviou também o historiador Procópio de Cesareia (490-562), então conselheiro do general, para que este compusesse uma coleção de registros narrativos destes conflitos. O objetivo era, segundo o próprio historiador, apresentar um registro que pudesse ser o mais verdadeiro possível em relação aos acontecimentos por ele testemunhados. Entretanto, as narrativas destas guerras se prestariam a construir uma memória gloriosa e vitoriosa de Justiniano, do general Belisário e de suas conquistas, e que pudessem servir como exemplo de um período grandioso para as futuras gerações de governantes e militares bizantinos. Estes livros, publicados em Constantinopla no ano 551, foram intitulados História das Guerras, e se dividiram entre as narrativas da Guerra Persa, Guerra Vândala e Guerra Gótica.
Considerando que as principais e mais severas críticas de Procópio de Cesareia ao governo e às guerras de Justiniano ficaram reservadas para outra obra, postumamente intitulada História Secreta, e que só veio a ser conhecida do grande público séculos após a morte do historiador, podemos considerar que os livros da História das Guerras alcançaram seu objetivo de apresentar ao público um imperador vitorioso e que foi capaz de restaurar importantes territórios no Mediterrâneo, incorporando-os novamente às possessões imperiais.
Nossa reflexão será direcionada às estratégias apresentadas por Procópio para compor a História das Guerras, de modo a não apenas apresentar ao leitor um cenário de exaltação aos grandes feitos políticos e militares de Justiniano, mas também não deixar margens para questionamentos quanto à veracidade de suas narrativas. Para tanto, traçaremos um paralelo entre as Guerras e outras duas obras no estilo clássico antigo: Histórias de Heródoto e História da Guerra do Peloponeso, de Tucídides, ambas do século V a.C. A justificativa para esta abordagem está no fato de que estas obras podem ter sido tomadas como modelos historiográficos por Procópio de Cesareia.
Entretanto, cabe aqui problematizar o entendimento proposto pelo historiador bizantino para a ideia de “verdade” histórica. Afinal, como podemos compreender essa “verdade” nos escritos de Procópio de Cesareia? Trabalhamos com a hipótese de que o recurso ao estilo clássico antigo na História das Guerras tenha sido um fundamento retórico utilizado por Procópio, com objetivos políticos de fortalecimento da imagem de Justiniano enquanto governante, que tinha um de seus elementos de narrativa o comprometimento com a verdade dos registros a partir do testemunho do historiador. Neste trabalho, pretendemos analisar a construção dos textos de Procópio, compreendendo-os como uma narrativa comprometida, antes de tudo, com a imagem do governo de Justiniano, e que, para isto, se utilizou de artifícios retóricos para fortalecimento político e militar da figura deste importante imperador bizantino.
Em nosso estudo, compreendemos que a narrativa feita por Procópio na História das Guerras, ao se aproximar do estilo de escrita grego clássico, busca fundamentar seus textos sobre a ideia de que a história é um tipo narrativo comprometido com a “verdade”, o que não se aplicaria, por exemplo, a poesia (De Bello Persico I. i. 4). O resultado pretendido era, através da utilização de um recurso retórico fundamentado numa tradição historiográfica, beneficiar o imperador Justiniano, criando na memória de seus contemporâneos e de gerações futuras, uma imagem consolidada e indiscutível de um governante que, no exercício de sua autoridade política, teria alcançado um grande destaque, não apenas no seu período de governo, mas para toda a história do Império.
Portanto, pretendemos refletir sobre a escrita da História das Guerras em Procópio, compreendendo-a como uma narrativa produzida no estilo clássico dos antigos historiadores gregos Heródoto e Tucídides, mas inserida num contexto histórico próprio do período de Justiniano e desenvolvida a partir de objetivos e preocupações específicas do século VI em Bizâncio, que lidavam com um engrandecimento e preservação da memória política e militar do governo imperial diante dos longos conflitos travados contra populações persas, vândalas e góticas.
Bibliografia:
Documentos analisados:
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PROCOPIUS. De Bello Gothico. History of The Wars. The Gothic War. English translate by H. B. Dewing. London: Havard University Press. Cambridge, Massachusetts, London. 2006.
PROCOPIUS. De Bello Persico. History of The Wars. The Persian War. English translate by H. B. Dewing. London: Havard University Press. Cambridge, Massachusetts, London. 1996 (1ª edição: 1914).
PROCOPIUS. De Bello Vandalico. History of The Wars. The Vandalic War. English translate by H. B. Dewing. London: Havard University Press. Cambridge, Massachusetts, London. 2006.
TUCIDIDES. History of the Poleponnesian War. English translate by Charles Forster Smith. London: Havard University Press. Cambridge, Massachusetts, London. 1988.
Referências bibliográficas
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